Espírita
ou espírita kardecista?
Escreve: Márcio Rogério Horii
E-mail: rbmcont@mandic.com.br
Vamos reproduzir um diálogo muito comum entre duas
pessoas.
-
(P1)
Qual a sua religião?
-
(P2)
Espírita.
-
(P1)
Ah ... sei ...... espírita ....
-
(P2)
É..., mas sou espírita kardecista!!!
Uma situação corriqueira da vida cotidiana. Mas vai aqui
algo muito interessante.
Por que P2 fez questão de reafirmar sua religião
utilizando o termo “espírita kardecista” e não ficou simplesmente no “espírita”?
Foi neste caso para dizer que ele não era da Umbanda, do Candomblé, ou outras
seitas africanas.
Convém notar entretanto que na tentativa de se fazer
diferenciado, P2 acabou passando para P1 a idéia de que pode existir mais de um
tipo de espírita, ou por outro lado mais de um tipo de Espiritismo. P2 pode ter
conseguido seu objetivo que era não ser confundido com um praticante de seitas
africanas (nada temos contra os mesmos), mas acabou, sem querer, abrindo uma
lacuna para que P1 pensasse ou agora tivesse
certeza que o Espiritismo oferece opções para subdivisões.
O termo “espírita kardecista” nunca foi mencionado na
Codificação. Não existe e nunca existiu. Este é empregado como um linguajar
popular entre os espíritas ou mesmo entre os não espíritas, justamente para que devido a ignorância da
população houvesse uma justa diferenciação de religiões. O prof. Herculano
Pires muito argumentou sobre o sincretismo religioso em nosso povo.
Na verdade, a palavra espírita não pode ser utilizada da
mesma forma que a palavra médico porque ela não comporta (doutrinariamente
falando) um adjetivo vindo em seguida para qualificá-la. Se alguém diz que é
medico perguntamos qual a sua especialidade, pois a medicina oferece especializações. Deste
modo, pode haver o médico oftalmologista, o médico ortopedista, o médico
pediatra, o médico homeopata, etc, mas não pode haver o espírita kardecista, o
espírita umbandista, o espírita budista, etc. Existe somente “o espírita”. Eis
tudo. Em última análise, nos utilizamos do pensamento kardecista ou
kardequiano, mas seguimos a Doutrina dos Espíritos.
É compreensível a utilização do termo espírita
kardecista quando na boa intenção da “diferenciação de religiões”, mas não
quando tememos com isso ser rotulados de macumbeiros, endemoniados ou coisa
parecida. Pode até ser que pela cabeça do outro nem passou a intenção de nos
qualificar com termos pejorativos, mas o nosso receio disso é talvez tão grande
que antecipando qualquer possível discriminação já tratamos logo de nos diferenciar,
evidenciando assim nossa própria dose de preconceito. Além do que, esse temor e
essa insegurança mostraria que damos um valor muito mais acentuado ao que acham
ou podem achar de nós, que são fatos inconcretos, do aquilo que somos em
verdade, que é um fato concreto. É melhor ser taxado de filho das trevas sem o
ser do que ser reverenciado como filho da luz e ter que sustentar uma mentira.
Lembrando que Jesus, o Cristo, foi
chamado de malfeitor e isso não mudou em absolutamente nada sua condição de
Espírito puro.
Esse tipo de mecanismo que criamos através das palavras,
para que os espíritas não sejam misturados a outras seitas é como dissemos
compreensível, mas, as coisas talvez não precisassem ser assim. Seria
preferível que ao invés de utilizarmos esses subterfúgios duvidosos, que
colocam em evidência as vezes nossas próprias imperfeições, conseguíssemos
disseminar entre a massa o que é e o que
não é Espiritismo, seja no boca a boca, palestras ou através da mídia. Como
dizem, é melhor curar a ferida do que ficar afugentando as moscas.
É lógico que isso somente será sensato, coerente,
racional e justificável quando os
espíritas transitarem da infância para a madureza espiritual. Dizemos isso
porque querem reunir dentro de nosso movimento espírita, vejamos só,
espíritas-kardecistas,
espíritas-místicos, espíritas-laicos, espíritas-roustainguistas etc. Não
sabemos como.
Usar o termo espírita-kardecista para diferenciar
religião é questão de expressão equivocada. Mas, empregar os termos mencionados
acima para diferenciar os espíritas entre os próprios espíritas é questão
de concepção ignorada, mostrando que o
Movimento Espírita em geral sabe o que é fé raciocinada, mas não sabe
raciocinar devidamente para chegar a ela. Amarelo é amarelo, verde é verde, vermelho
é vermelho, azul é azul. Incremente qualquer uma dessas cores ao branco alvo do
Espiritismo e este automaticamente perderá sua coloração original. E, de dose
em dose, não veremos ao final nem rastro
do branco. E não são poucos os que vêem ou querem fazer da Doutrina Espírita
uma verdadeira aquarela de utopias.
É bom nos instruirmos rapidamente para não corrermos o
risco de termos que reproduzir em breve o diálogo acima da seguinte maneira :
-
Que
tipo de espírita é você?
-
Ah
... sou espírita laico ..... ou sou espírita místico ..... etc etc.
Seria uma catastrófica tristeza.
Texto publicado no site em
29/10/99
NovaVoz – Grupo Espírita Bezerra
de Menezes
São José do Rio Preto – SP
E-mail – novavoz@zaz.com.br
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